quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

# 279



Eu aproveitava para pensar em coisas inúteis, algo que tinha começado a fazer há alguns anos (...) e que me parecia cada vez mais fecundo e necessário.

Julio Cortázar - O Jogo do Mundo (Rayuela)

# 278



apercebi-me num instante que para te ver como eu queria era necessário começar por fechar os olhos

Julio Cortázar - O Jogo do Mundo (Rayuela)


sábado, 26 de dezembro de 2015

# 277



a um mandrião deve dar-se, precisamente, falta de trabalho


Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 276



Dá a impressão que à volta o mundo se vai apertando.


Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 275



é preciso termos constantemente flores à sua volta (...) Para meterem medo à outra.


Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 274


- O que tem ela? (...)

- Um nenúfar! - disse Colin. - Onde é que o teria apanhado?
- Tem um nenúfar? - perguntou Nicolas, incrédulo.
- No pulmão direito - disse Colin.

Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 273



Havia qualquer coisa de etéreo nas variações de Johnny Hodges, qualquer coisa de inexplicável e autenticamente sensual. Sensualidade em estado puro, liberta do corpo. Os cantos do quarto modificavam-se e arredondavam-se sob o efeito da música. Colin e Chloé repousavam agora no centro de uma esfera.

Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 272



No sítio em que os rios se lançam no mar forma-se uma barra difícil de transpor e há grandes remoinhos de espuma onde bailam destroços.

Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 271



[Colin]

O coração ocupava todo o espaço que havia no seu peito, e só naquela altura ele se apercebia do facto.

Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 270



Chloé sentia no corpo uma força opaca, no tórax uma presença inimiga, não sabia como lutar e de vez em quando tossia para expulsar o adversário que se agarrava à sua carne mais profunda. Tinha a impressão, se respirasse fundo, de que iria entregar-se viva à raiva obscurecida do inimigo, à sua insidiosa malignidade.


Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 269



Colin corria, corria, e o ângulo agudo do horizonte comprimido entre as casas vinha ter com ele a toda a velocidade. Debaixo dos seus pés fazia noite. Uma noite de algodão negro, amorfa e inorgânica; e o céu estava sem cor, era um tecto, era mais outro ângulo agudo

(...)

não sabia o que tinha acontecido e corria, sentia medo, porque não basta estarmos sempre juntos, também é preciso sentir medo


Boris Vian - A Espuma dos Dias

sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

# 268



A rua ia dar a Chloé.
- Chloé, os teus lábios são doces. Tens uma pele cor de fruto. Os teus olhos vêem as coisas como devem ser vistas, e o teu corpo aquece-me...
(...)
Vão ser precisos meses e meses para eu me fartar dos beijos que te vou dar. Vão ser precisos anos de meses para esgotar os beijos que eu quero dar-te nas mãos, nos cabelos, nos olhos, no pescoço...
(...)
- Chloé, eu queria sentir os teus seios no meu peito, as minhas mãos cruzadas sobre o teu corpo, os teus braços à volta do meu pescoço, a tua cabeça perfumada na curva do meu ombro, a tua pele palpitante, o cheiro que vem de ti...


Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 267



O que me interessa não é a felicidade de todos os homens, mas de cada um em particular.

Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 266



De pé num canto da praça, Colin esperava por Chloé. A praça era redonda, tinha uma igreja, pombos, jardim, bancos, e em frente, no macadame, carros e autocarros. O sol também estava à espera de Chloé mas podia entreter-se a fazer sombras, a germinar sementes de feijão bravo em interstícios adequados, a empurrar postigos e a envergonhar um candeeiro aceso


Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 265


Colin agarrou numa faca de prata e começou a traçar uma espiral na brancura polida do bolo. Parou subitamente e olhou para a obra, surpreendido.
- Vou tentar fazer uma coisa - disse.
Tirou do centro de mesa uma folha do azevinho e agarrou no bolo só com uma mão, fazendo-o girar rapidamente na ponta de um dedo. Com a outra, colocou um dos picos da folha de azevinho sobre a espiral.
- Ouve! - pediu.
Chick ouviu. Era Chloe no arranjo de Duke Ellington.
Chick olhou para Colin. Viu-o muito pálido.
Tirou-lhe a faca das mãos e espetou-a no bolo com um gesto firme. Fendeu-o em dois, e dentro havia um novo artigo de Partre para Chick, e um encontro com Chloé para Colin.

Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 264



Chuchou o dedo e levantou-o acima da cabeça. Baixou-o logo a seguir. Ardia como se estivesse num forno. 
- O amor anda no ar - concluiu. - Está muito calor.

Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 263



O coração de Colin inchou desmesuradamente, fez-se leve, levantou-o do chão e entrou com ele atrás.

Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 262



havia algo no interior do seu tórax a tocar qualquer coisa parecida com música militar alemã, daquela em que se ouve o bombo e mais nada.


Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 261



A espera é um prelúdio em modo menor


Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 260



quando nos apaixonamos, somos idiotas, como sabe.


Boris Vian - A Espuma dos Dias

# 259



- É horrível! - disse Collin. - Sinto-me desesperado e ao mesmo tempo pavorosamente feliz. É bastante agradável termos a um tal ponto necessidade de qualquer coisa.


Boris Vian - A Espuma dos Dias

domingo, 13 de dezembro de 2015

# 258



Não me parece que o pirilampo extraia grande vantagem do facto incontornável de ser uma das maravilhas mais fenomenais deste circo, e no entanto basta supor nele uma consciência para compreender que, sempre que a sua barriga se acende de luz, ele deve sentir uma espécie de sensação de privilégio.


Julio Cortázar - O Jogo do Mundo (Rayuela)

# 257



sei que andei uns tempos a viver do que me era emprestado, a fazer o que os outros fazem e a ver o que os outros vêem.


Julio Cortázar - O Jogo do Mundo (Rayuela)

# 256



inventamos o nosso incêndio, ardemos de dentro para fora


Julio Cortázar - O Jogo do Mundo (Rayuela)

# 255



A nossa verdade possível tem de ser invenção


Julio Cortázar - O Jogo do Mundo (Rayuela)