domingo, 22 de setembro de 2013

# 106



Nos vastos salões da sua biblioteca, recomeçou as suas idas e vindas e invocou Confúcio. Este desceu da parede em frente, tranquilo e decidido, o que não representa mérito nenhum, quando se tem atrás de si uma vida já de séculos. Kien aproximou-se dele em largas passadas, esquecendo o respeito que lhe devia. A sua agitação contrastava estranhamente com a atitude do sábio chinês.
- Creio ter uma certa cultura! - gritou-lhe, a uns cinco passos de distância. E também algum tacto! Têm querido convencer-me de que a cultura e o tacto se encontram sempre juntos e que este é inconcebível sem aquela. Quem quis convencer-me disso? Tu! - Não vacilou em tratar Confúcio por tu. - E de repente, aparece uma pessoa sem um mínimo de cultura, mas com mais tacto, coração, dignidade e calor humano do que eu, tu e toda a tua escola de sábios junta!


Elias Canetti - Auto-de-Fé

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