# 461

De facto, a história do romance tem sido, desde os seus inícios, a história de uma rebelião constante e extrema contra as leis ou costumes inventamos pelo próprio romance. As criações nada ortodoxas de Laurence Sterne, Gustave Flaubert, Susan Strand, Carlo Emílio Gadda, Witold Gombrowitz, Samuel Beckett, Georges Perec, Natalie Sertaut, Dorothy Hewitt e William Gaddis, entre tantos outros, criaram leis atractivas e novas para a narrativa, leis que nasceram já, no entanto, projectadas para a sua inevitável morte, para essa destruição a que até as próprias leis - orgulhosas mas flexíveis - souberam desde o primeiro momento que era a única a que deviam aspirar.

Enrique Vila-Matas - Chet Baker pensa na sua arte

# 460

Sempre acreditei que não é conveniente determo-nos no que se conseguiu, e que é muito interessante fugir disso, procurar novos desafios, aplicar com alegria e convicção de que, embora nunca cheguemos a nada, merecem a pena os meandros desse caminho para o nada, porque em alguns deles teremos de nos cruzar com insensatas aventuras, e talvez também com novas formas inesperadas.

Enrique Vila-Matas - Chet Baker pensa na sua arte

# 459

posso dedicar-me a pensar na possibilidade de que um dia a escrita comece a deslizar, muito subtilmente, para o Finnegans, para uma literatura mais próxima da realidade bárbara, brutal, muda, sem significado, das coisas.

Enrique Vila-Matas - Chet Baker pensa na sua arte

# 458

se existe o sentido da realidade, deve existir também o sentido da possibilidade


Enrique Vila-Matas - Chet Baker pensa na sua arte

# 457

Acho que apenas a meditar, apenas a escrever, vou realmente despertando de verdade.


Enrique Vila-Matas - Chet Baker pensa na sua arte

# 456

Beckett dizia que os escritores realistas engendram obras discursivas porque se concentram em falar sobre as coisas, sobre um assunto, enquanto "a arte autêntica não faz isso: a arte autêntica é a coisa e não algo sobre as coisas: Finnegans Wake não é arte sobre algo, é a arte em si"


Enrique Vila-Matas - Chet Baker pensa na sua arte

# 455

Acaso Joyce e Simenon são compatíveis? Vivi, em várias ocasiões, nas minhas obstinadas releituras parciais deste livro, a sensação de inenarrável (...), de perceber que estava perante o tipo de escrita que melhor se relaciona com a verdade da vida incompreensível.

Enrique Vila-Matas - Chet Baker pensa na sua arte

# 454

Tranquiliza-nos a simples sequência, a ilusória sucessão de factos. No entanto, há uma grande divergência entre uma confortável narração e a realidade brutal do mundo.


Enrique Vila-Matas - Chet Baker pensa na sua arte