sexta-feira, 3 de abril de 2015

# 222



Da janela da sala de estar onde se encontrava, com o cabelo ao vento, Rahel via a chuva a bater no telhado de chapa ferrugenta daquilo que fora a fábrica de pickles da avó.
Pickles & Conservas Paraíso.
Entre a casa e o rio.
Fabricavam pickles, sumos, compotas, pó de caril e ananás enlatado. E compota de banana (ilegalmente) depois de a O.P.A. (Organização dos Produtos Alimentares) a banir porque, segundo os seus critérios, aquilo não era compota nem geleia. Demasiado líquida para geleia e demasiado espessa para compota. Uma consistência ambígua, inclassificável, diziam eles.
Segundo rezavam os seus livros.
Olhando agora para trás, parecia a Rahel que essa dificuldade da família com classificações tinha raízes muito mais fundas do que a questão da compota-geleia.
Talvez Ammu, Eshta e ela própria fossem os piores transgressores. Mas não eram os únicos. Havia também os outros. Todos eles quebraram as regras. Todos eles atravessaram território proibido. Todos eles perverteram as leis que estipulavam quem devia ser amado e quem não devia.
(...) 
tudo começou realmente na época em que as Leis do Amor foram feitas. As leis que estipulavam quem devia ser amado, e como.
E quanto.


Arundhati Roy - O Deus das Pequenas Coisas

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