sábado, 27 de junho de 2015

# 232



E eu sou parecido com quem? Seguramente que tenho algo de equilibrista que, numa alameda do fim do mundo, se passeia pela linha do horizonte. E creio que me movo como um explorador que avança no vazio. Não sei, trabalho nas trevas e é tudo misterioso. Só sei que me fascina escrever sobre o mistério de que exista o mistério da existência do mundo, porque adoro a aventura que há em todo o texto que pomos em andamento, porque adoro o abismo, o próprio mistério, e adoro, além disso, essa linha de sombra que, ao cruzá-la, vai parar ao território do desconhecido, um espaço onde de repente tudo nos é muito estranho, sobretudo quando vemos, como se estivéssemos no estado infantil da linguagem, nos toca voltar a aprender tudo, embora com a diferença de que, em criança, nos parecia que podíamos estudar e entender tudo, enquanto que na idade da linha de sombra vemos que o bosque das nossas dúvidas nunca se tornará nítido e que, além disso, o que a partir de então iremos encontrar serão apenas sombras e treva e muitas perguntas.
Então, quando nos acontece uma coisa destas, eu creio que o melhor que podemos fazer é continuar em frente, nem que seja só para ter a impressão de sermos empurrados para a frente pela nossa própria recusa em avançar.

Enrique Vila-Matas - Doutor Pasavento

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