domingo, 25 de junho de 2017

# 324



Mas o amor, essa palavra...

(...)

Meu amor, não te amo por ti, nem por mim, nem pelos dois juntos, não te amo porque o sangue me leve a amar-te, amo-te porque não és minha, porque estás do outro lado, de onde me convidas a saltar para ti e eu não posso, porque no mais fundo da possessão não estás em mim, não chego até ti, não passo para lá do teu corpo, do teu sorriso

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uma ponte não se sustém apenas de um lado

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deseja um amor-passaporte, um amor passa-montanhas, um amor-chave, um amor-revólver, um amor-que-lhe-ofereça-os-mil-olhos-de-Argos, a ubiquidade, o silêncio a partir do qual a música é possível, a raíz a partir da qual se poderia começar a tecer uma língua

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Total parcial: quero-te. Total geral: amo-te

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Aquilo a que muita gente chama amar consiste em escolher uma mulher e casar-se com ela. Escolhem-na, juro-te, eu vi-os fazerem-no. Como se se pudesse escolher no amor, como se o amor não fosse um raio que te parte os ossos e que te deixa petrificado no pátio.

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Não se pode escolher Beatriz, não se pode escolher Julieta. Tu não escolhes a chuva que te vai ensopar até aos ossos quando sais de um concerto


Julio Cortázar - O Jogo do Mundo (Rayuela)

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