sábado, 19 de agosto de 2017

# 379


mas no entanto, nós os dois desenhamos uma figura (...) tu és um ponto em qualquer parte e eu noutra, ambos em movimento (...) e pouco a pouco (...) vamos construindo uma figura absurda, desenhando com os nossos movimentos uma figura idêntica à que duas moscas fazem quando voam numa sala, daqui para ali, um movimento browniano é exactamente isso, compreendes agora, um ângulo recto, uma linha que sobe, daqui para ali, de trás para a frente, para cima, para baixo, espasmodicamente, travando no ar e arrancando noutra direcção no mesmo instante, e esses movimentos vão formando um desenho, uma figura, qualquer coisa de inexistente como tu e como eu, como dois pontos perdidos (...) que vão de cá para lá, de lá para cá, fazendo o seu desenho, dançando para ninguém, nem sequer para eles mesmos, uma figura interminável e sem sentido.

Julio Cortázar - O Jogo do Mundo (Rayuela)

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