domingo, 20 de agosto de 2023

# 545

 

O sentido é muitas vezes ditado pela língua que se utiliza. Algo é dito não porque o autor decidiu dizê-lo de uma determinada forma, mas porque naquela língua específica é necessária uma certa sequência de palavras para obter um sentido, uma certa melodia é considerada agradável, certas construções são rejeitadas como cacofónicas, têm um duplo sentido ou parecem ter caído em desuso. Todos os atributos em voga da linguagem conspiram para privilegiar um agrupamento de palavras em detrimento de outro.

(…) A tradução é o acto supremo de compreensão. Para Rilke, o leitor que lê para traduzir envolve-se no “processo mais puro” de perguntas e respostas, através do qual a mais inapreensível das noções, a significação literária, é respigada. Respigada, mas nunca tornada explícita, porque, na alquimia particular deste tipo de leitura, a significação imediatamente se transforma num outro texto equivalente. E a significação do poeta progride de palavras em palavras, numa metamorfose de uma língua para outra.


Uma História da Leitura - Alberto Manguel 

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