sábado, 19 de agosto de 2023

# 536

 

Seja qual for a forma como os leitores fazem seu um livro, o resultado é que esse livro e o leitor se tornam um só. O mundo que o livro é, devora-o o leitor, que é uma letra no texto do mundo; assim se cria uma metáfora circular para o carácter interminável da leitura. Nós somos aquilo que lemos. O processo através do qual o círculo se completa não é, como defende Whitman, apenas intelectual; lemos intelectualmente a um nível superficial, apreendendo certos sentidos e conscientes de certos factos, mas, ao mesmo tempo, invisível e inconscientemente, o texto e o leitor entrelaçam-se, criando novos níveis de sentido, de forma que, de cada vez que extraímos qualquer coisa do texto ao ingeri-lo, nasce simultaneamente algo nele que ainda não apreendemos. É por isso que - como Whitman acreditava, ao reescrever e reeditar os seus poemas repetidamente - nenhuma leitura pode jamais ser definitiva.


Uma História da Leitura - Alberto Manguel 

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